Elaine dos Santos aposta na educação pública e acha que na sala de aula pode contribuir para mudar o mundo
É com a matemática que a professora Elaine Karine Lima dos Santos muda o mundo. Docente há mais de 10 anos, ela se orgulha cada vez que descobre que uma ex-aluna ou um ex-aluno seguiu o caminho dos números, depois de ela ter conseguido desmistificar a dificuldade normalmente atribuída às ciências exatas.
Seus professores foram importantes para que ela escolhesse esse caminho profissional. Há três anos, inclusive, ela quis honrar os educadores que mudaram seu caminho com um agradecimento feito cara a cara. Era Dia dos Professores e Elaine achou que seria justa homenagem visitar quem ajudou a formá-la para dizer como o papel deles tinha sido importante.
“Eu perguntei à minha mãe quem tinha me alfabetizado, porque eu não lembrava. Ela me disse que foi Nazaré e fui atrás dela pra dizer como ela tinha mudado minha vida”, lembra a professora. “É preciso respeitar e valorizar cada vez mais os professores, que precisam ser mais bem remunerados, reconhecidos, aplaudidos. E isso pode ser feito também pelos alunos, eu fui lá como aluna.”
Sobre outros professores ela nem precisou perguntar à mãe, se lembrava muito bem. Como do matemático Mário Dantas, com quem estabeleceu um laço tão forte que ele deixou a Elaine os livros que tinha.
“Antes de morrer pediu, ele pediu que eu fosse à casa dele e ficasse com parte dos livros”, conta. “Um jeito de a memória e o conhecimento serem propagados. E essa é a memória afetiva que quero levar aos meus alunos também, como uma professora que enxerga o estudante além das paredes da sala de aula, que cria um vínculo a ponto de um dia eu poder deixar meus livros pra quem eu saiba que vai continuar a perpetuar esse ciclo.”
Família de educadoras
Elaine veio de uma família de mulheres professoras, o que também foi definidor para que ela escolhesse a profissão. O objetivo dela é se dedicar à escola pública, da qual ela também é fruto. A professora, que já lecionou na rede estadual de Sergipe e hoje atua na rede de Alagoas, conta já ter visto muita gente se transformar.
“A educação transforma pessoas e essas pessoas transformadas conseguem transformar suas decisões, suas escolhas – escolhas que às vezes não têm volta – e é isso que eu acho que posso transformar, pessoas”, reflete. “O que eu mais gosto é transmitir um pouco do legado que ficou em mim pelos meus educadores e ter a chance de provocar mudanças nos jovens. Ser professora é a possibilidade que eu tenho de contribuir para dias melhores.”
Hoje professora da Escola Estadual Comendador José da Silva Peixoto, em Penedo, Alagoas, Brasil, Elaine já encabeçou projetos, ganhou prêmios e recebeu destaques pelo trabalho, que extrapola a matemática e mira também o desenvolvimento cidadão que ela acredita ser chave para o futuro dos estudantes.
No ano passado, esteve à frente de uma prática que mobilizou os estudantes para discutir crimes cibernéticos e a propagação de notícias falsas pela internet. A professora convidou profissionais de diferentes áreas – do direito à psicologia – para conversar com os alunos e esclarecer a gravidade e os efeitos de ações cometidas virtualmente.
“Eu percebi que seria importante eles entenderem a legislação, por exemplo. Porque eles compartilhavam coisas sem pensar por falta de esclarecimento, porque não entendiam que podiam até ser responsabilizados criminalmente”, explica Elaine. “Por isso eu trouxe instituições para o ambiente escolar para criar diálogos, é também um jeito de formar cidadãos.”
O projeto foi apresentado no 6º Encontro Estudantil, em Maceió, e ganhou um prêmio. Elaine lembra que era nova na escola quando recebeu o desafio de criar um projeto integrador, que fosse além do conteúdo da sala de aula, e não sabia bem por onde começar. Para ela, o fato de a escola ser de Ensino Médio Integral fez toda a diferença para a elaboração e para o resultado do projeto.
“O integral me ajudou muito porque eu não tenho um contato raso com os alunos, eu consigo fazer a conexão com eles, conhecê-los melhor e de um jeito holístico”, avalia. “Foi aí que fui percebendo que o tema fazia sentido para eles e que eu conseguiria também cativar atenção com a proposta.”
Mulher e professora
Hoje Elaine celebra a própria trajetória, mas para chegar aí passou por obstáculos, inclusive a dificuldade de ser uma mulher que escolhe cursar matemática.
“Nascer mulher já não é fácil e ser mulher professora também não é fácil. Eu sou fruto de uma mulher que começou a lecionar, mas seu tempo não a permitiu continuar. Minha mãe passou a ser dona de casa, mãe e não foi reconhecida por isso”, lamenta.
A professora destaca ainda os entraves para as mulheres em cursos majoritariamente masculinos, como os da área das ciências exatas.
“Ser mulher e cursar matemática não é fácil. Por isso, para mim é uma honra e uma alegria participar de movimentos para validar, reconhecer e aplaudir mulheres. Independentemente de sua área de atuação, poder fazer nosso trabalho não precisa ser uma luta, precisa ser um direito. Para que sejamos respeitadas no nosso ambiente de trabalho e fora dele.”
Neste mês de março, o Instituto Natura celebra as conquistas e o legado das mulheres na Educação no Brasil e na América Latina. Mulheres como Elaine, cujo trabalho como professora transforma a vida de milhares de crianças e jovens. A todas as professoras nosso reconhecimento e respeito.