Ensino Médio Integral se destaca no Brasil

Escrito por Emmanuel Macêdo

A ambição brasileira de chegar em 2022 com nota 6 no Ideb do Ensino Médio, comparável a países desenvolvidos, pode ser alcançada e o Brasil já tem um caminho possível: as escolas de Ensino Médio Integral em Tempo Integral (EMITI).
Pelo Brasil inteiro, as Escolas de Ensino Médio Integral se destacam notadamente sobre as escolas parciais, com a aproximação da escola junto ao aluno e foco no protagonismo do estudante para definir seu futuro.
O Tempo Integral prova ser a melhor opção para o desenvolvimento pleno dos estudantes e solução para problemas educacionais brasileiros.

Luís, Daniel, Eduarda e Sinelândia

A história de um garoto que queria fazer Direito, mas acabou se descobrindo na Química poderia ser do João, do Ricardo, da Juliana ou da Daniela. Mas é do Luís Fernando. E quem é o Luís Fernando?
Luís Fernando é um jovem de 20 anos, que cursa Licenciatura em Química na Universidade Federal do Acre (UFAC). O sonho dele, ainda no Ensino Médio, era cursar Direito para prestar concurso para a Polícia Federal. O tempo passou e hoje quer tornar a educação brasileira melhor, na área que ele é apaixonado.
Mas, quem mesmo é o Luís Fernando?
Para explicar o Luís Fernando temos de conhecer o maranhense Daniel, também de 20 anos, funcionário da Secretaria de Educação do Maranhão que cuida de programas para a cidadania e vislumbra ser professor de Biologia no futuro.
Luís Fernando e Daniel são como a Eduarda, paraibana, estudante de fisioterapia e que um dia se viu tão longe como profissional da área que pensou em desistir. “Antes eu dizia que queria ser fisioterapeuta. Depois passei a dizer que eu iria ser fisioterapeuta”, diz.
Paraibana também é Sinelândia, que já havia traçado seu futuro: ajudar a mãe em casa e conseguir algum trabalho que, com sorte, poderia pagar um salário-mínimo. Hoje, faz faculdade e será professora de Matemática.
Os quatro não se conhecem, mas possuem um vínculo que jamais imaginam: o crescimento da educação do Brasil. Egressos de escolas com Ensino Médio Integral em Tempo Integral, Luís, Daniel, Eduarda e Sinelândia são fruto de uma das mais importantes políticas públicas brasileiras.
“A escola integral trabalha as competências, o protagonismo, a solidariedade, a autonomia. Quando a gente vai para uma escola integral a gente muda o perfil”, explica Luís Fernando. Essa transformação o fez perceber que o seu futuro não era no Direito, mas, sim, na Química.
Já o Daniel entendeu que a escola o tirou da individualidade e o levou para o coletivo. “O Daniel de 17 anos era o Daniel individual. O Daniel de 20 anos é o Daniel do Maranhão inteiro”, traduz. A frase encaixa com todo o trabalho pedagógico realizado para entregar o jovem para a vida em sociedade.
Quando a escola em tempo integral tira o jovem da caixinha, ele se torna mais confiante, como aconteceu com a Eduarda. A menina, inclusive, desejou ser fisioterapeuta para ajudar pessoas como precisou fazer com a avó. “A escola mudou minha vida tanto para a graduação como me formou como cidadã”, completa.
E o que dizer de Sinelândia, jovem, negra, pobre do interior nordestino? “As pessoas me diziam que eu não conseguiria. Mas na escola você encontra pessoas que acreditam em você e vai lutar junto com você”, explica.
As quatro histórias ilustram um Brasil onde a educação dá certo. A receita está dada e as experiências são vastas. Agora que você conhece um pouco do Luís Fernando, do Daniel, da Eduarda e da Sinelândia, que tal saber um pouco mais sobre o Ensino Médio em Tempo Integral e aprofundar como ele muda o país?

O que é o Ensino Médio em Tempo Integral?

O modelo do Ensino Médio em Tempo Integral busca formar o estudante por uma proposta pedagógica multidimensional conectada à sua realidade e no desenvolvimento de suas competências cognitivas e socioemocionais. Ela coloca o aluno no centro, construindo toda a abordagem e metodologia a partir de quem ele é, e quem ele sonha ser. Essa construção de saber inclui, também, as expectativas de aprendizagem do Ensino Médio e o desenvolvimento acadêmico dos alunos.

Como ocorre a ampliação da jornada?

Para a operacionalização do Ensino Médio em Tempo Integral é necessário ampliar a jornada de toda a comunidade escolar. Significa que as equipes de gestão das escolas, os professores e o as equipes administrativas também têm sua jornada ampliada.

Desempenho melhor do que as parciais

O melhor exercício para comparar se o modelo dá certo ou não é separar as notas do Ideb das escolas parciais com as escolas em tempo integral. Com o resultado de 2019, o modelo integral conseguiu uma média 17,5% maior. Enquanto o Ideb das parciais é de 4 pontos, o das integrais alcança 4,7 pontos, ultrapassando a meta do Plano Nacional de Educação para a etapa de ensino.
Outro índice que ajuda a entender a eficácia do modelo é o crescimento proporcional. As escolas que eram parciais em 2017 e migraram para o modelo integral em 2019 tiveram uma melhora de 17,3% no Ideb. Já as que permaneceram no modelo parcial cresceram apenas 9,7% no índice em 2019.
O modelo atraiu os estados mais pobres do país, que viram uma oportunidade de melhoria mais rápida do processo educacional. Pernambuco, por exemplo, é o estado que mais avançou no Ensino Médio nos últimos anos. A partir de 2008, quando o modelo integral foi adotado como política pública, o rendimento no Ideb cresceu e acompanhou a expansão anual do número de escolas e matrículas. Em 2019, a rede estadual pernambucana ocupa o 3º lugar no ranking nacional. Em 2007, estava em 22º lugar.
Ceará e Paraíba também conseguiram resultados expressivos no último Ideb, saltando 10,5% e 16,1% respectivamente, bem mais que a média nacional. Os dados estão em um estudo elaborado pelo Instituto Natura e o Instituto Sonho Grande utilizando números do Ideb.
Essa melhora significativa das médias de quem utiliza o modelo foi fundamental para a melhoria da média geral do Brasil. No entanto, como a política de tempo integral ainda não está presente na maioria das matrículas do Ensino Médio brasileiro, o resultado final, na comparação com 2017, é de estagnação alterando apenas 0,4 ponto positivamente. Mas a causa para o crescimento é cada vez mais clara que passa pela ampliação da política.

No Ensino Médio em Tempo Integral, um ano de Português e Matemática equivale a três anos letivos em escolas de tempo parcial.

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Onde está o Ensino Médio em Tempo Integral?

Em 2016, o governo federal lançou a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), que garante aos estados o repasse de R$ 2 mil por aluno/ano durante o período de 10 anos. Os estados que aderiram à política devem dar preferência a escolas em regiões de maior vulnerabilidade e infraestrutura mínima.

Qual a Meta para EMTI?

A expansão do Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI) é uma resposta ao Plano Nacional de Educação (PNE), que, na meta 6, prevê a oferta para pelo menos 50% das escolas públicas atendendo pelo menos 25% dos estudantes até 2024.

O que é Ideb?

A expansão do Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI) é uma resposta ao Plano Nacional de Educação (PNE), que, na meta 6, prevê a oferta para pelo menos 50% das escolas públicas atendendo pelo menos 25% dos estudantes até 2024.

Afinal, qual é o diferencial?

O Ensino Médio Integral em Tempo Integral (EMTI) visa a formação integral dos estudantes, a partir de uma proposta pedagógica multidimensional, conectada à realidade dos jovens e ao desenvolvimento de suas competências cognitivas e socioemocionais.
É justamente por buscar entender o universo de cada estudante que o ensino se torna mais assertivo. É claro que para isso a ampliação da jornada escolar para 7 ou 9 horas por dia se torna essencial e auxilia na solidificação do conteúdo, que é demonstrado com a integração entre teoria e prática em aulas mais dinâmicas e em laboratórios.
O modelo busca envolver o aluno em diversas situações. O projeto de vida, por exemplo, ensina o estudante a construir seu futuro com planejamento, diminuindo as chances de se tornar um profissional frustrado.
Outro ponto trabalhado é o protagonismo juvenil. Fazer com que o estudante do ensino médio entenda que só ele pode escrever a própria história é parte importante do processo de engajamento e empoderamento. Muito desse protagonismo é alcançado com as eletivas, quando o estudante escolhe o que fazer com atividades interdisciplinares e inovadoras.
Para conseguir o engajamento dos estudantes, a escola estimula o convívio e a colaboração, acolhendo jovens e suas famílias, muitas delas com pouca ou nenhuma participação prévia na vida escolar do aluno.
Dentro dessa escola, os educadores acompanham de perto o desenvolvimento dos estudantes com o projeto de Tutoria. Ao mesmo tempo, ele recebe orientações sobre técnicas de estudo, autonomia e colaboração.

Depoimentos

"O Projeto de Vida nos auxilia na elaboração de tomada de decisões na nossa vida, com metas e objetivos para serem alcançados."
Paulo César
Aluno da Escola Alberto Santos Dumont (Santana-AP)
"O aluno ele não é mais um aluno, ele é o aluno. Então eu conheço cada um pelos rostinhos, pelos nomes e sobrenomes."
Rafaela
Professora da Escola José Guedes Cavalcante (Cabedelo-PB)
"Uma escola de tempo integral vai além das aulas a mais. Junto das aulas de português e matemática, todos aqueles componentes que a gente já tinha em uma escola tradicional, temos a oportunidade de outras atividades, como, por exemplo, uma eletiva, tutoria dos professores ou pós-médio."
Luiza Maria
Aluna da Escola Professora Clarinda Mendes de Aquino (Campo Grande-MS)
"Eu vejo muita diferença da escola que eu estudava para essa é porque lá era muito frio. A gente ia para a escola, fazia cinco aulas e ia embora. Não tinha contato com professor, não tinha contato com diretor. A gente ia só para estudar mesmo. Não tinha esse negócio do amor por estudo como tenho hoje."
Sara
Aluna da Escola Joaquim Beato (Serra-ES)
"A mudança para o tempo integral foi em 2013. A princípio eu não acreditei que isso daria certo. Pensei, mais uma política, mais uma mudança que daqui a um ano a gente volta ao que era antes. Mas eu comecei a perceber que essa escola estava se transformando. Tínhamos uma nota de 4,3 para 5,6, ficamos em segundo lugar em Goiânia, no Ideb, entre as escolas em tempo integral. Hoje eu defendo, conheço e sei que é o ideal."
Divina Rocha
Gestora do Centro de Ensino em Período Integral Juvenal José Pedroso (Goiânia-GO)
"Hoje eu trabalho na Secretaria de Estado da Educação com os programas para a cidadania para fomentar o protagonismo estudantil dos jovens maranhenses. A Escola em Tempo integral me mudou. O Daniel de 17 anos era o Daniel individual. O de 20 anos é o Daniel do Maranhão inteiro."
Daniel Araújo
Egresso do Tempo Integral (São Luís-MA)
"Eu me encantei com o projeto da escola. Fiz uma escolha, junto com meu esposo, e decidimos colocá-la na escola. Depois que ela começou estudar, mudou a visão de futuro dela. Hoje ela sabe o que quer, se encontrou, já sabe qual faculdade quer fazer."
Michelle
Mãe de aluna do Tempo Integral (Rio Branco-AC)

O custo adicional de uma escola integral passa pela merenda e pela remuneração dos professores, mas com as quedas na evasão e na repetência, o custo por aluno formado torna-se apenas 33% maior.

EMITI: maior escolaridade, maior renda

Não é segredo para ninguém que quanto maior a escolaridade, mais há chances de uma pessoa conseguir aumentar a renda. No entanto, o que um estudo do Instituto Sonho Grande com egressos de escolas em tempo integral de Pernambuco mostrou foi que existe uma relação importante de crescimento de renda entre os estudantes do tempo integral.
Esse crescimento da renda vem na esteira justamente do aumento das chances do aluno do tempo integral adquirir mais interesse e aumentar as chances de possuir uma escolaridade mais alta. Pelo estudo, a probabilidade de ingressar no ensino superior é 17 pontos percentuais maior para indivíduos formados em escolas integrais (63% contra 46% das parciais), uma diferença significativa.
Esses resultados acadêmicos estão relacionados ao tempo de aula bem utilizado e baixa quantidade de aulas dispensadas / substituídas. Além disso, os elementos diversificados da matriz curricular, que envolvem a tutoria, a orientação para projeto de vida, as práticas de protagonismo, entre outros, também auxiliaram fortemente para o resultado.
Como consequência da escolaridade é possível perceber um aumento de renda logo no início da carreira, com uma maior probabilidade de indivíduos oriundos de escolas integrais estarem em faixas de renda superiores.
Mas o resultado mais impactante aconteceu ao analisar a diferença salarial entre os egressos de Pernambuco das raças branca e preta. O segundo grupo normalmente aparece, nas escolas parciais, com ganhos 10% inferiores. No entanto, nas escolas de tempo integral a diferença não mais existe, mostrando a capacidade de trazer também uma equidade racial.
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