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Compromisso pela Alfabetização na América Latina faz imersão em Sobral

Comitiva latino-americana visita escolas para trocas sobre bons exemplos do município cearense

“Claro que tem dias que eu acordo e eu quero dormir mais. Mas eu penso no meu futuro. O que faz o futuro da pessoa é o presente dela”. A Maria Júlia Lima Silva tem só 13 anos e toda essa segurança sobre estar fazendo a melhor aposta possível ao dedicar energia e entusiasmo à escola. Ela é aluna de uma das escolas públicas de tempo integral de Sobral, município cearense que virou referência mundial por seus resultados na educação de crianças e jovens.

Maria Júlia está à beira do Ensino Médio e reconhece o valor da trajetória escolar até aqui, que permitiu que ela aprendesse e desenvolvesse habilidades que considera fundamentais para a vida adulta. “Eu quero entrar na escola profissionalizante, então eu tenho que começar desde cedo a estudar para atingir as minhas metas. Além de ter várias pessoas me apoiando também, o que me ajuda, motiva mais”.

A escola em que ela estuda foi uma das seis escolas visitadas em uma imersão realizada durante a Jornada de Implementação do Compromisso pela Alfabetização na América Latina, idealizada pelo Instituto Natura e pelos parceiros Centro Lemann de Sobral e Fundação Lemann além de outras organizações latinas. A experiência reuniu 35 representantes de organizações de Argentina, Chile, Colômbia, México, Peru e Brasil.

Na visita, a comitiva participou de um encontro com a equipe técnica da Secretaria de Educação do município e conversou com professores e alunos como a Maria Júlia, para entender como Sobral conseguiu engajar toda a comunidade escolar, a partir de políticas públicas consistentes e de um trabalho colaborativo entre gestores, professores e comunidade. 

Para dois dos idealizadores e implementadores das mudanças sobralenses que tiveram início há cerca de 27 anos, uma das chaves do caminho bem sucedido foi o investimento na alfabetização no tempo adequado. “Inicialmente, nosso maior desafio foi compreender por que as crianças não dominavam a leitura e a escrita na idade adequada e, posteriormente, desenvolver soluções eficazes para essa questão”, contaram Veveu Arruda, ex-prefeito de Sobral e diretor da Associação Bem Comum, e Ivo Gomes, atual prefeito do município. 

Além de aprofundar o compromisso com a alfabetização e com ações coletivas, a Jornada de Implementação teve o objetivo de facilitar a troca de conhecimentos, experiências e soluções entre os parceiros,  bem como facilitar espaços de reflexão e se inspirar com os bons exemplos encontrados no município.

Entre as iniciativas destacadas pelos empreendedores sociais do município, estão estratégias para o fortalecimento da gestão escolar, o fortalecimento da ação pedagógica e a valorização do magistério, além de ações para garantir a permanência e a frequência dos estudantes. “Fazemos uma busca ativa dos nossos alunos, registramos quantos alunos estão matriculados e quantos, a cada dia, não compareceram. Ligamos para a família e, se for o caso, vamos até a residência para verificar o motivo da ausência. O aluno se sente valorizado e mostramos como a família precisa assumir o compromisso conosco”, explica Fabiana Torquato Braga, diretora da escola de Ensino Fundamental Leonel Brizola.

O investimento na educação pública do município aparece nos números. Em 2000, apenas 49% dos estudantes da rede municipal aprendiam a ler na idade certa em Sobral. Em 2004, o índice saltou para 92%. A Diretora-Executiva do Centro Lemann de Sobral, Anna Penido, destacou no encontro a importância dessas conquistas e como elas se tornaram um modelo para outras cidades brasileiras. 

A experiência encontra ecos em ações que também têm sido implementadas em outros países da América Latina. “Ter políticos engajados e visão de longo prazo faz toda a diferença quando se trata de alfabetizar crianças e acompanhar o seu desenvolvimento escolar”, enfatizou Santiago Isaza Arango, diretor da Fundação Luker, da Colômbia, que também destacou a relevância de alianças e coalizões nesse processo.

Na troca de experiências entre os participantes da Jornada, desafios em comum apareceram em Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru. Entre eles, a falta de dados confiáveis, a falta de formação adequada de professores e a dificuldade de implementar políticas contínuas.

A produção de dados qualificados e a atenção dada a eles na construção de políticas públicas são parte da estratégia bem sucedida de Sobral. Para a Gerente de Alfabetização do Instituto Natura Brasil, Márcia Ferri, seria importante ter uma medição comparativa entre os países, o que poderia ser o primeiro passo de um compromisso pela alfabetização que una os países da América Latina e acelere a evolução da educação – um compromisso que possa ser também referência para o restante do mundo.

As trocas do encontro abriram caminho para a consolidação de intenções e para o aprendizado de estratégias no sentido de uma educação pública de qualidade. Para que haja cada vez mais histórias como a da Maria Júlia, que tem na escola um porto seguro e que abraça a educação como as asas de que ela precisa para voar alto. “Se você tem um sonho para alcançar, tem metas para cumprir também, então é sempre bom se sentir acolhido pela escola. E aí pode ir em frente. Seguir, nunca desistir”, ensina a jovem estudante.

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